terça-feira, 7 de outubro de 2008

Calçadas trincadas

São Paulo. Meu Deus, ainda estou aqui. É difícil acreditar que entrei para a horda de pessoas que perseveram na idéia de que ficar por aqui é preciso para se conseguir algo. Juro que às vezes fecho os olhos e estou em Búzios. Irônico. Não me dou bem com a praia. Meu físico só foi amigo do cenário por 3 anos. Abro os olhos. São Paulo não liga muito para isso. Hoje estou formado, a faculdade deixa todas as suas babaquices para trás e eu me reconforto sabendo que muito que eu disse em conselho aos meus coleguinhas é verdade. Conforto idiota. Ninguém me aplaude no pequeno ônibus—sábios.

Estou a caminho de um trabalho que foi sonhado há 5 anos. É gostoso pensar assim. Mas aí me lembro da sala, sem sofá, sem tapete, uma metáfora concretizada de que eu ainda não tenho laços com minha própria rotina. Muita gente faz isso. Tenho medo de ser um hóspede que vive 30 nos em um quarto sem desfazer as malas, auto-iludido de que irá partir a qualquer momento. Mas eu teimo.

O microônibus chega ao destino, uma estação de trem com gente bem-vestida, mal-educada e mais ou menos consciente disso. O dia promete. Uma cotovelada de uma senhorinha. Me pergunto imaginando de que cidade ela veio, com idéias mais ou menos parecidas com a minha...e como essa química existente entre o que queremos e o que São Paulo nos oferece produz materiais tóxicos, uma névoa de mal-humor, que paira, intoxica a todos e aos poucos cria sedimentos de ressentimento em alguns.

Eu me dei um tempo. Estou nesse “infarto-lifestyle” novamente há pouco tempo. É meu segundo round. Eu já sei como é importante manter as pernas tão vivas quanto a cabeça, e relaxar a ambição com o mesmo esmero que fazemos com o pescoço, esperando o trem.

Um rapaz acelera ao meu lado, desesperado às nove e quarenta da manhã para passar à minha frente no bloqueio. O trem não está vindo. É, eis um paulistano, ou um Lemming, criatura de um jogo de 92. O pior é que nem posso dizer que aqueles eram bons tempos—é difícil ser saudosista neste mundo banda-larga/vida-curta.

Fecho os olhos novamente. Quando abro, vejo uma moça impecável. Engraçado. Quando pegamos a mesma estação de trem todos os dias, começamos a nos tornar um pouco síndicos da imagem que todos que ali ficam compõe. Ela é uma nota fora da melodia chata da estação Cidade Universitária. Vai procurar emprego. Sem explicação, sem eira nem beira, todos sabemos isso. Ela arruma o cabelo.

O trem chega. O único banco livre é refém da falta de ministros da educação eficientes no país. O homem é dono de pernas e braços patrocinados pelo MST. Eu sinto o fel paulistano patrocinando 0.03% de um possível infarto. Filho da puta. Eu vou me sentar.


Me sento, ele continua a pressionar. Burro sou eu—assim ele deve imaginar, uma vez que é dono de um aroma publicitário, divulgador de sua amabilidade. Estação Hebraica-Rebouças, uma moça desce e me liberta daquele banco.

Mudo de assento. O homem olha e dá uma leve bufada, como rinocerontes fazem com fotógrafos exóticos—um pequeno incômodo.

Chego à Vila Olímpia. Meu cenário. Hora de procurar um futuro estável se equlibrando pelas calçadas trincadas de um lugar que todos os dias mostra com seu trânsito, conduta das pessoas e condições climáticas que a última coisa que um ser inteligente pode esperar desta região é estabilidade.

2 comentários:

Fernanda disse...

AH!
Esse Frio Non Sense de São Paulo!
Essa cidade me irrita e mesmo assim eu insisto em morar aqui.
Tendo Santos inteira pra morar, eu quis mudar pra São Paulo!
"Ah, tem Museu" , "Ah, Tem Teatro".
Metrê Lotado de manhã! AI caramba!
Aquele rosto com rosto (com desconhecidos!) me irrita.
Mas aí, eu chego no meu destino, a Faculdade, e as pessoas de lá (de São Paulo) me parecem tão acessiveis e minhas aulas tão boas, que eu esqueço.
Eu esqueço que quase quebrei o braço às 7h da manha na estação da Sé.

Bom, é só o começo...


Beijos!

Unknown disse...

E sua rotina litorânea, como é?